Chamados para fora: O verdadeiro propósito da Igreja

Chamados para fora

A palavra igreja, no grego koiné, é ἐκκλησία (ekklēsía), que literalmente significa “os chamados para fora” (ek = para fora; klēsis = chamado).

Essa definição original revela que a identidade e a missão da igreja não se limitam às quatro paredes de um templo.

Somos uma comunidade convocada por Deus para sair da zona de conforto e entrar no campo de batalha espiritual, proclamando as boas novas a todos os povos (Mc 16:15; Mt 28:19-20).

No entanto, em muitas realidades, vemos um distanciamento desse propósito.

Assim como Israel, no início da missão de Moisés, resistiu à liderança divina, a igreja contemporânea corre o risco de perder de vista que somos chamados para fora.

Quando a missão se torna centrada apenas nos que já estão dentro, o Evangelho se fecha em si mesmo, e vidas continuam perdidas.

Este Refrigério Teológico busca analisar biblicamente, historicamente e de forma prática o que significa ser chamados para fora, contrastando com a postura de uma igreja voltada apenas para dentro, e apontando caminhos para restaurar a verdadeira missão.

Olá, graça e paz, aqui é o seu irmão em Cristo, Pr. Francisco Miranda do Teologia24horas, que essa “paz que excede todo entendimento, que é Cristo Jesus, seja o árbitro em nosso coração, nesse dia que se chama hoje…” (Fl 4:7; Cl 3:15).

Chamados para fora: O propósito de Deus desde o início

Desde a criação, o agir de Deus na história revela Seu caráter missionário e expansivo.

A própria narrativa de Gênesis começa com um Deus que “chama” a luz à existência (Gn 1:3), e o verbo hebraico usado — קָרָא (qārā’) — significa não apenas falar, mas convocar para um propósito.

Esse padrão de convocação se repetirá ao longo de toda a história bíblica: Deus chama, separa e envia para que Seu nome seja conhecido entre as nações.

Abraão – O chamado que gerou uma nação missionária

Quando o Senhor chama Abrão (mais tarde Abraão), a ordem é clara e imperativa: “Sai-te (לֶךְ־לְךָ, lek-lekha) da tua terra… para a terra que eu te mostrarei” (Gn 12:1).

Esse “lek-lekha” carrega a ideia de movimento intencional, de deixar algo para trás para cumprir uma missão diante de Deus.

O propósito dessa separação é explicitado no versículo 3: “…em ti serão benditas todas as famílias da terra” (mishpechot ha’adamah – famílias, clãs, povos).

Aqui está o DNA missionário do povo de Deus: não é um chamado para isolamento, mas para ser canal de bênção.

O apóstolo Paulo ecoa isso ao afirmar que o Evangelho anunciado a Abraão foi “em ti serão benditas todas as nações” (Gl 3:8), mostrando que desde o início Deus desejava alcançar todas as etnias (panta ta ethne, Mt 28:19).

Moisés – O libertador que tipifica Cristo

Séculos depois, Deus manifesta novamente Seu caráter missionário ao levantar Moisés como libertador.

A ordem é inequívoca: “Vem agora, pois, e eu te enviarei a Faraó, para que tires o meu povo, os filhos de Israel, do Egito” (Êx 3:10).

O verbo hebraico שָׁלַח (shalach), “enviar”, usado neste contexto, não significa apenas despachar, mas comissionar com autoridade.

Deus não envia Moisés para um mero ato político, mas para uma missão redentora, um ato tipológico que aponta para a obra de Cristo, o Libertador definitivo (Hb 3:1-6).

Contudo, antes de atender ao chamado, Moisés enfrenta rejeição: “Quem te pôs a ti por príncipe e juiz sobre nós?” (Êx 2:14), frase que Estêvão retoma em Atos 7:27 ao expor a resistência de Israel àqueles que Deus levanta.

A rejeição inicial de Moisés antecipa a rejeição que o próprio Cristo sofreria: “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam” (Jo 1:11).

O êxodo — cujo nome vem do grego ἔξοδος (exodos), “saída, partida” — é mais do que um evento histórico; é um paradigma espiritual.

Representa a libertação do jugo do pecado (Jo 8:34-36), a passagem das trevas para a luz (Cl 1:13), e a condução do povo de Deus “para fora” (ek, do grego, como na palavra ekklēsía) rumo à terra prometida.

É a imagem perfeita daquilo que significa ser chamados para fora: deixar a escravidão do Egito espiritual e caminhar em direção à liberdade que há em Cristo.

A Igreja – A comunidade enviada ao mundo

Assim como Moisés foi enviado para libertar Israel, a igreja — a ekklēsía, literalmente “a assembleia dos chamados para fora” — é enviada para resgatar os que estão presos em cadeias espirituais.

Jesus leu em Nazaré a profecia de Isaías 61:1 e a aplicou a si mesmo: “O Espírito do Senhor é sobre mim, pois me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me (apestalken, do grego apostellō, “enviar com uma missão”) a curar os quebrantados do coração, a pregar liberdade aos cativos…” (Lc 4:18).

O termo apostellō conecta a missão de Jesus à missão da igreja, pois o mesmo Cristo que foi enviado pelo Pai envia agora Seus discípulos: “Assim como o Pai me enviou, também eu vos envio a vós” (Jo 20:21).

Portanto, ser chamados para fora não é uma metáfora bonita; é a essência da nossa vocação.

Como Abraão, somos chamados a sair. Como Moisés, somos enviados a libertar.

Como a igreja primitiva, somos comissionados para ir até os confins da terra (At 1:8), proclamando “as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pe 2:9).

Chamados para fora no Novo Testamento

O Novo Testamento não apenas preserva o conceito missionário iniciado no Antigo Testamento, mas o expande e aprofunda, revelando seu ápice na pessoa e na obra de Cristo.

A palavra grega usada para “igreja” é ἐκκλησία (ekklēsía), formada por ἐκ (ek, “para fora”) e καλέω (kaleō, “chamar”), significando literalmente “os chamados para fora”.

Essa expressão era usada na Grécia antiga para designar assembleias civis convocadas para decisões públicas, mas no contexto cristão, passou a designar a comunidade convocada por Deus para viver sob Seu senhorio e cumprir Sua missão no mundo (Mt 16:18).

Jesus não formou um grupo para se isolar, mas para ser uma comunidade enviada.

Sua ordem em Atos 1:8 é clara: “Sereis minhas testemunhas (μάρτυρες, mártyres) tanto em Jerusalém, como em toda a Judeia e Samaria, e até aos confins da terra”.

O termo mártyres, além de significar testemunha ocular, no contexto cristão assume o sentido de alguém que confirma sua mensagem até o ponto de derramar o próprio sangue (Ap 2:13).

Isso mostra que o chamado para fora não é apenas geográfico, mas envolve entrega total e disposição para enfrentar oposição.

Pedro e Paulo: Dois chamados, uma missão

O apóstolo Pedro, identificado biblicamente como apóstolo da circuncisão (Gl 2:7-8), recebeu a incumbência de liderar a proclamação do evangelho entre os judeus.

Inicialmente, sua atuação permaneceu restrita a Jerusalém e às regiões judaicas, refletindo uma fase em que a igreja ainda estava fortemente centrada em seu contexto cultural original.

É notável que, mesmo após Pentecostes, a expansão para além do círculo judaico foi lenta, a ponto de Deus intervir sobrenaturalmente para levar Pedro à casa de Cornélio (At 10:9-48), quebrando paradigmas religiosos e étnicos.

Paulo, por sua vez, é chamado diretamente por Cristo no caminho de Damasco (At 9:3-6) e comissionado como “instrumento escolhido” (σκεῦος ἐκλογῆς, skeuos eklogēs, At 9:15) para levar o evangelho aos gentios, aos reis e aos filhos de Israel.

Seu ministério é marcado por travessias de fronteiras culturais, linguísticas e geográficas.

O verbo grego usado para “enviar” em relação a Paulo, *ἀποστέλλω (apostellō), transmite a ideia de envio com autoridade oficial, como um embaixador (2Co 5:20).

Pedro e Paulo tinham públicos distintos, mas uma só missão — cumprir a Grande Comissão (poreuthentes mathēteusate panta ta ethne, Mt 28:19), que implica ir intencionalmente, fazer discípulos e ensinar todas as nações.

O perigo da estagnação: A unção de Pedro sem a unção de Paulo

O perigo para a Igreja é permanecer apenas na “unção de Pedro” — cuidando do que já está estabelecido, preservando o território seguro — sem avançar para a “unção de Paulo”, que se lança ao desconhecido, alcançando os não alcançados.

A estagnação missionária foi um problema real na igreja primitiva: mesmo após a ressurreição, os discípulos permaneceram reunidos em Jerusalém até que a perseguição os dispersou (At 8:1-4).

O chamado “para fora” exige superar barreiras culturais, preconceitos e zonas de conforto.

Paulo viveu isso ao se tornar “tudo para todos” (panta tois pasin, 1Co 9:22), adaptando-se culturalmente sem comprometer a mensagem do evangelho.

Esse espírito missionário deve impregnar a igreja contemporânea, pois o próprio Cristo orou não para que fôssemos tirados do mundo, mas guardados do mal enquanto permanecemos no campo missionário (Jo 17:15-18).

Em síntese, Pedro e Paulo representam dimensões complementares do mesmo chamado: cuidar do rebanho já alcançado e abrir novos campos para a mensagem de Cristo.

Negligenciar qualquer uma dessas dimensões é distorcer o mandato original do Mestre, que nos fez chamados para fora para sermos testemunhas “até os confins da terra” — expressão que, no grego (heōs eschatou tēs gēs), denota o alcance máximo possível, sem limites geográficos ou étnicos.

Quando a Igreja esquece que é chamada para fora

EEm Atos 1:8, Jesus declara de forma inequívoca: “Sereis minhas testemunhas (μάρτυρές, mártyres) tanto em Jerusalém, como em toda a Judeia e Samaria, e até aos confins da terra (ἕως ἐσχάτου τῆς γῆς, heōs eschatou tēs gēs)”.

O termo mártyres não indica apenas quem relata um fato, mas, no contexto cristão primitivo, designa aqueles dispostos a selar seu testemunho com a própria vida — origem da palavra “mártir”.

A expressão heōs eschatou tēs gēs aponta para o alcance máximo da missão, abrangendo não apenas espaço geográfico, mas também todos os povos e culturas (cf. Mt 28:19; Mc 16:15).

Contudo, ao lermos Atos 2 a 7, percebemos que a igreja primitiva, mesmo após o derramamento do Espírito Santo no Pentecostes (At 2:1-4), permaneceu concentrada em Jerusalém.

Lucas registra que “estavam todos unanimemente no alpendre de Salomão” (At 5:12) — o Pórtico de Salomão, no recinto do Templo, tornou-se o ponto de reunião e ensino dos apóstolos.

Embora fosse um lugar estratégico para o testemunho aos judeus, a ordem de Jesus não se restringia à capital; tratava-se de um envio progressivo que deveria atravessar fronteiras religiosas, étnicas e geográficas.

Foi apenas em Atos 8:1, após a morte de Estêvão e a intensa perseguição liderada por Saulo de Tarso, que “todos foram dispersos (διεσπάρησαν, diesparēsan) pelas terras da Judeia e Samaria, exceto os apóstolos”.

O verbo diaspeirō — de onde vem “diáspora” — significa espalhar como quem semeia. Ou seja, o que parecia uma tragédia tornou-se o instrumento soberano de Deus para que Sua palavra se espalhasse (At 8:4; cf. Gn 50:20; Rm 8:28).

Teologicamente, este episódio ecoa um padrão que já se vê no Antigo Testamento: quando Israel se fechava em si mesmo e esquecia sua vocação de ser “luz para as nações” (’or goyim, Is 49:6), Deus permitia dispersões e exílios para cumprir Seus propósitos globais (cf. Dt 28:64; Jr 29:4-7).

A igreja, como a ekklēsía — “a assembleia dos chamados para fora” (ek = para fora; kaleō = chamar) — não existe para autossatisfação, mas para proclamar “as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pe 2:9).

Esse relato de Atos 8 é, portanto, um alerta atemporal: se a igreja não avança voluntariamente, Deus pode permitir circunstâncias que nos empurrem para fora, removendo zonas de conforto e expondo-nos ao campo missionário real.

A missão não é um complemento opcional da fé; é um ato de obediência direta ao Senhor da seara (Mt 9:37-38).

Permanecer centrados apenas no que é interno pode até preservar estruturas, mas não cumpre a razão pela qual fomos chamados.

Sintomas de uma Igreja voltada para dentro

Uma igreja que esquece que é ἐκκλησία (ekklēsía) — a assembleia dos “chamados para fora” (ek = para fora; kaleō = chamar) — corre o risco de tornar-se um grupo fechado, mais parecido com um clube religioso do que com o Corpo de Cristo em missão (Ef 4:11-16).

Quando isso acontece, surgem sinais claros de estagnação espiritual e perda da essência missionária.

Linguagem exclusiva “comunicação apenas para os de dentro

Quando os sermões e conversas da comunidade cristã são recheados de jargões e termos internos, incompreensíveis para quem está de fora, a igreja falha no princípio de Colossenses 4:5-6:

“Andai com sabedoria para com os que estão de fora (τοὺς ἔξω, tous exō), remindo o tempo. A vossa palavra seja sempre agradável, temperada com sal, para que saibais como vos convém responder a cada um.”

Jesus, ao falar com multidões, usava parábolas (Mt 13:34), imagens do cotidiano e uma linguagem acessível.

O apóstolo Paulo se fez “tudo para todos” (panta tois pasin, 1Co 9:22) para ganhar a maior quantidade possível.

A exclusividade linguística não é sinal de santidade, mas de isolamento — e isolamento é incompatível com a missão (Mt 28:19).

Prioridade em conforto interno “estruturas acima de almas

Quando a igreja investe a maior parte de seus recursos e energia em melhorar apenas suas instalações, eventos e comodidades internas, mas negligencia o envio e o sustento de missionários, ela inverte a ordem bíblica.

Em Amós 6:1, o profeta denuncia:

“Ai dos que estão à vontade em Sião…” (ha-sha’ănannîm bĕTsiyyôn), alertando contra a complacência espiritual.

O Novo Testamento mostra que a prioridade da igreja primitiva não era a manutenção de prédios, mas a proclamação do evangelho (At 4:31-35; At 13:1-3).

Jesus não edificou auditórios, mas vidas — e o templo vivo que Ele constrói é formado por pedras vivas (1Pe 2:5), não por estruturas de concreto.

Disputas e picuinhas “energia desviada da missão

Discussões internas e irrelevantes consomem tempo e forças que deveriam ser investidos no cumprimento da Grande Comissão.

Paulo advertiu Timóteo contra “questões tolas e insensatas” (μωρὰς δὲ καὶ ἀπαιδεύτους ζητήσεις, mōras de kai apaideutous zētēseis, 2Tm 2:23), pois elas apenas geram contendas.

A igreja de Corinto é um exemplo clássico: enquanto se dividia entre facções (“Eu sou de Paulo, eu de Apolo, eu de Cefas…” – 1Co 1:12), negligenciava o testemunho para com o mundo.

Jesus ensinou que um reino dividido não pode subsistir (Mc 3:24-25) — e uma igreja centrada em picuinhas está, na prática, enfraquecendo sua capacidade de alcançar os perdidos.

Desprezo pelos de fora “a mentalidade do se vierem, que venham”

Quando a mentalidade predominante é esperar que as pessoas venham até a igreja, em vez de ir até elas, a comunidade está desobedecendo ao “ide” (πορευθέντες, poreuthentes, Mt 28:19), que no grego é um particípio de ação contínua — “indo” — indicando movimento constante.

O desprezo pelos de fora contradiz o próprio coração de Deus, que “quer que todos os homens se salvem” (1Tm 2:4) e que, como o pastor da parábola, deixa as noventa e nove para buscar a ovelha perdida (Lc 15:4-7).

A igreja que ignora essa busca ativa está, na prática, desprezando o sacrifício de Cristo, que “veio buscar e salvar o que se havia perdido” (Lc 19:10).

Esses sintomas — linguagem exclusiva, prioridade em conforto interno, disputas internas e desprezo pelos de fora — revelam uma desconexão entre a identidade da igreja como ekklēsía e sua prática diária.

Quando a comunidade de fé deixa de ser sal da terra (halas tēs gēs, Mt 5:13) e luz do mundo (phōs tou kosmou, Mt 5:14), ela perde seu sabor e relevância.

O antídoto é retornar ao chamado original: ser chamados para fora para ir ao encontro dos perdidos, como Cristo fez e ordenou que fizéssemos.

Chamados para fora e a grande comissão

A Grande Comissão, registrada em Mateus 28:19-20 e Marcos 16:15, não é um apêndice da vida cristã, mas o centro da identidade da igreja. Jesus, ressurreto e revestido de toda autoridade no céu e na terra (exousia, Mt 28:18), ordena aos discípulos:

“Ide (πορευθέντες, poreuthentes) por todo o mundo (κόσμος, kosmos) e pregai o evangelho (εὐαγγέλιον, euangelion) a toda criatura (πάσῃ τῇ κτίσει, pasē tē ktisei)” (Mc 16:15).

O particípio aoristo poreuthentes, traduzido como “ide”, transmite a ideia de movimento intencional e contínuo — mais precisamente, “enquanto estiverem indo”.

Não é uma ação opcional, mas a postura normal de quem é discípulo. No hebraico, a ideia equivalente encontra-se no verbo שָׁלַח (shalach), usado repetidas vezes no Antigo Testamento para descrever o envio de profetas (Is 6:8; Jr 1:7).

Assim, a Grande Comissão é o eco neotestamentário do padrão divino de enviar Seus servos ao mundo.

Chamados para fora – Mais que um nome, uma vocação

A igreja, como ἐκκλησία (ekklēsía), é por definição “a assembleia dos chamados para fora” (ek = para fora; kaleō = chamar).

Esse chamado não é apenas para sair de um lugar, mas para ir em direção a algo — neste caso, em direção às nações (ἔθνη, ethnē, Mt 28:19), abrangendo todos os povos, culturas e línguas (Ap 7:9).

Quando compreendemos que somos chamados para fora, nossa perspectiva sobre missão e ministério é radicalmente transformada:

  1. O templo deixa de ser o destino final e se torna ponto de partida – No Antigo Testamento, o culto era centrado no Templo em Jerusalém (Sl 122:1), mas no Novo Testamento a igreja é o corpo vivo de Cristo espalhado no mundo (1Co 3:16-17; Ef 2:21-22). O ajuntamento serve para capacitar, edificar e enviar (Ef 4:11-12), não para reter.
  2. Os recursos se voltam onde há fome espiritual – A igreja primitiva investia nas regiões e pessoas não alcançadas (At 13:2-3; 2Co 11:8-9). O envio de Barnabé e Paulo de Antioquia para as missões gentílicas demonstra que o alvo da igreja não era fortalecer apenas o “dentro”, mas avançar “para fora”.
  3. A linguagem se adapta sem perder a essência – Paulo, em 1Coríntios 9:22, afirma: “Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns”. Isso significa comunicar o evangelho de forma inteligível e relevante para quem nunca o ouviu, como fez em Atenas ao dialogar no Areópago usando referências culturais locais (At 17:22-28).

A ordem de Jesus é imperativa: “ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado” (Mt 28:20).

O verbo didaskontes (“ensinando”) está no presente contínuo, indicando que o discipulado é um processo ininterrupto.

A obediência à Grande Comissão é a prova prática de que entendemos nossa identidade como chamados para fora.

Negligenciá-la é viver em contradição com a oração sacerdotal de Cristo, onde Ele afirma: “Assim como Tu me enviaste (ἀπέστειλας, apesteilas) ao mundo, também Eu os enviei (ἀπέστειλα, apestēla) ao mundo” (Jo 17:18).

Chamados para fora: Comunicação que alcança os perdidos

O apóstolo Paulo nos exorta em Colossenses 4:6: “A vossa palavra (λόγος, lógos) seja sempre agradável (χάρις, cháris – graça, favor), temperada com sal (ἅλας, hálas), para que saibais como vos convém responder (ἀποκρίνεσθαι, apokrinesthai) a cada um.”

A expressão “agradável” no grego (en chári) não significa discurso bajulador, mas comunicação marcada pela graça divina — capaz de transmitir o amor de Deus de forma inteligível e edificante.

O “sal” é um símbolo bíblico de pureza, preservação e sabor (Mt 5:13; Lv 2:13), apontando para uma palavra que preserva a verdade e desperta sede por mais.

O verbo apokrinesthai implica responder de maneira contextual e apropriada, considerando a situação e a pessoa diante de nós.

Essa orientação está intimamente ligada à identidade da igreja como ἐκκλησία (ekklēsía) — “os chamados para fora” (ek = para fora; kaleō = chamar).

Uma igreja chamados para fora não fala apenas para si mesma, mas se comunica de modo a alcançar “os de fora” (τοὺς ἔξω, tous exō), expressão usada por Paulo em 1 Coríntios 5:12 e Colossenses 4:5 para se referir aos que ainda não fazem parte da comunidade de fé.

Isso significa:

  1. Usar exemplos do cotidiano – Assim como Jesus fez em Suas parábolas (Mt 13), usando imagens conhecidas do campo, da pesca e da vida doméstica para explicar verdades eternas. A teologia da encarnação (Jo 1:14) nos ensina que a Palavra eterna se fez carne e habitou entre nós — e nossa comunicação deve igualmente se fazer compreensível no contexto das pessoas.
  2. Responder dúvidas reais da sociedade – Pedro orienta: “Estai sempre preparados para responder (ἀπολογία, apología – defesa bem fundamentada) com mansidão e temor a todo aquele que vos pedir a razão da esperança que há em vós” (1Pe 3:15). Isso exige escuta atenta e resposta bíblica contextualizada às questões contemporâneas.
  3. Evitar jargões que afastam os que estão de fora – O uso excessivo de expressões internas pode criar barreiras desnecessárias. Paulo escreve em 1 Coríntios 14:9: “Assim também vós, se com a língua não pronunciardes palavras bem inteligíveis, como se entenderá o que se diz? Pois estareis como que falando ao ar.” O conteúdo deve ser fiel à verdade do evangelho (euangelion, Mc 1:15), mas a forma precisa ser clara e acessível.

Uma igreja chamados para fora fala de modo que o mundo compreenda, sem diluir ou distorcer a mensagem.

Como Paulo afirma em 2 Coríntios 4:2, rejeitamos “o oculto da desonestidade, não andando com astúcia, nem adulterando a palavra de Deus, mas pela manifestação da verdade, recomendando-nos à consciência de todo homem diante de Deus.”

Essa combinação de clareza, graça e verdade reflete o próprio ministério de Cristo, que “cheio de graça e de verdade” (Jo 1:14) comunicava-se tanto com mestres da Lei quanto com pecadores e marginalizados.

A história confirma: O Evangelho avança quando saímos

Desde os dias da igreja primitiva, a expansão do Evangelho está diretamente ligada à obediência ao mandato missionário.

No livro de Atos dos Apóstolos, vemos que a perseguição em Jerusalém, longe de silenciar os cristãos, tornou-se o catalisador para a propagação da fé:

“E os que foram dispersos (διασπαρέντες, diasparentes), iam por toda a parte anunciando a palavra” (At 8:4).

O verbo grego diaspeirō, que dá origem ao termo “diáspora”, significa espalhar como quem lança sementes.

Lucas usa essa palavra para mostrar que a perseguição funcionou como a mão de Deus lançando o Evangelho sobre o solo fértil de novas terras e culturas.

Durante o Império Romano, a rede de estradas, a relativa estabilidade política (Pax Romana) e a difusão do grego koiné como língua comum tornaram possível que os cristãos levassem a mensagem de Cristo por todo o Mediterrâneo.

Cidades estratégicas como Antioquia (At 11:19-26), Éfeso (At 19:10) e Roma (At 28:30-31) se tornaram centros de envio missionário, cumprindo a promessa de Atos 1:8.

Ao longo da história, homens e mulheres que entenderam que a igreja é ἐκκλησία (ekklēsía), “os chamados para fora”, romperam barreiras culturais e geográficas para levar o Evangelho até os confins da terra.

  • William Carey (1761–1834) – Conhecido como o “pai das missões modernas”, deixou a Inglaterra para levar o Evangelho à Índia. Sua famosa frase — “Espere grandes coisas de Deus; empreenda grandes coisas para Deus” — ecoa o espírito de Atos 13:2-3, quando Barnabé e Saulo foram enviados.
  • Hudson Taylor (1832–1905) – Fundador da Missão ao Interior da China, adotou o vestuário, os costumes e a língua do povo que buscava alcançar, aplicando na prática o princípio paulino de “fazer-se tudo para todos” (1Co 9:22).
  • Amy Carmichael (1867–1951) – Missionária irlandesa na Índia, resgatou meninas de templos pagãos e dedicou sua vida à proteção e discipulado de centenas de crianças, vivendo Mateus 25:40: “Sempre que o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.”

Nos séculos XX e XXI, igrejas que abraçaram a identidade de chamados para fora têm experimentado crescimento genuíno: multiplicação de discípulos (Mt 28:19), plantação de congregações (At 14:21-23) e transformação comunitária (Tt 3:14).

A história missionária contemporânea mostra que onde a igreja sai de si mesma e vai ao encontro do perdido, o Reino de Deus avança — mesmo em contextos de oposição política, cultural ou religiosa.

A conclusão é inevitável: o Evangelho não foi projetado para ficar confinado a paredes ou culturas específicas.

Assim como no passado, o avanço hoje exige obediência, coragem e disposição para cruzar fronteiras visíveis e invisíveis, confiando que “o campo é o mundo” (Mt 13:38) e que a colheita ainda é grande (Jo 4:35).

Aplicações práticas para hoje

A missão da igreja como ἐκκλησία (ekklēsía) — “os chamados para fora” (ek = para fora; kaleō = chamar) — exige não apenas compreensão teológica, mas também ação estratégica. A seguir, alguns passos práticos, biblicamente fundamentados, para que a igreja cumpra sua vocação de forma integral.

Reformule o foco do culto “do altar para o mundo

Os cultos devem manter o equilíbrio entre edificação interna e alcance externo.

Jesus disse: “Ide (πορευθέντες, poreuthentes)… fazei discípulos” (Mt 28:19).

Isso implica que o ajuntamento no templo é um ponto de partida, não de chegada.

Cultos evangelísticos regulares, com linguagem acessível e oportunidades claras de decisão, refletem o espírito de Atos 2:47, onde “o Senhor acrescentava à igreja, todos os dias, os que iam sendo salvos.”

Programe a Igreja para a rua “semeando no campo

O modelo de Jesus e dos apóstolos foi ir até as pessoas: pregar nas sinagogas (Mc 1:39), nas praças (At 17:17) e até em cadeias (At 16:25-34).

Evangelismo criativo, ações sociais e eventos em locais públicos tornam visível a mensagem invisível do evangelho.

No hebraico, a palavra para “enviar” — שָׁלַח (shalach) — transmite a ideia de comissionar com um propósito.

Assim como os setenta foram enviados de dois em dois (Lc 10:1), a igreja hoje deve sair estrategicamente para semear a Palavra onde há fome espiritual.

Invista em missões locais e globais “de Jerusalém aos confins da terra

A ordem de Jesus em Atos 1:8 é simultânea: testemunhar em Jerusalém (local), Judéia e Samaria (regional) e até os confins da terra (global). Isso requer:

  • Apoio financeiro (Fp 4:15-16)
  • Treinamento missionário (2Tm 2:2)
  • Envio intencional (At 13:2-3)

O exemplo da igreja de Antioquia mostra que uma comunidade saudável não retém seus melhores líderes, mas os envia para cumprir a missão.

Treine cada membro como missionário “todos no campo

O discipulado bíblico visa formar multiplicadores, não apenas consumidores de conteúdo espiritual.

Efésios 4:11-12 ensina que líderes foram dados “para o aperfeiçoamento (καταρτισμός, katartismos – preparo completo) dos santos para a obra do ministério.”

Quando cada membro entende que é um missionário no ambiente onde vive, trabalha e estuda, a Igreja deixa de depender apenas de eventos e passa a viver missões como estilo de vida.

Isso reflete o ensino de 1 Pedro 3:15, de estar sempre preparado para responder sobre a esperança que há em nós.

O custo da obediência

Responder ao chamado divino como ἐκκλησία (ekklēsía) — “os chamados para fora” — é abraçar uma jornada marcada por fé, mas também por rejeição, perseguição e desconforto.

A história bíblica e a experiência da igreja mostram que seguir a Deus exige disposição para perder privilégios terrenos em favor de uma herança eterna (Hb 11:24-26).

A rejeição de Moisés

Quando Moisés, ainda no Egito, tentou intervir em favor de seus irmãos, ouviu a amarga pergunta:

“Quem te pôs a ti por príncipe e juiz sobre nós?” (Êx 2:14).

O verbo hebraico usado para “pôs” é שִׂים (sîm), que significa estabelecer, nomear ou designar.

Esse questionamento não era apenas pessoal, mas um desafio à autoridade dada por Deus.

Séculos depois, Estêvão relembra esse episódio em Atos 7:27, mostrando que a rejeição dos mensageiros divinos é um padrão recorrente na história de Israel — um padrão que culminou na rejeição do próprio Cristo (Jo 1:11).

O aviso de Jesus

Jesus preparou Seus discípulos para enfrentar a oposição do mundo:

“Se o mundo (κόσμος, kosmos) vos aborrece (μισεῖ, misei – odiar), sabei que, primeiro do que a vós, me aborreceu a mim” (Jo 15:18).

Aqui, kosmos não significa apenas o planeta, mas o sistema humano em rebelião contra Deus (1Jo 2:15-17).

O termo misei implica um ódio ativo, não mera indiferença. Obedecer ao chamado significa entrar em conflito direto com esse sistema, como aconteceu com os profetas (Jr 20:8-9) e apóstolos (At 5:41).

O custo e a promessa

Seguir a Cristo envolve negar a si mesmo e carregar a cruz diariamente (Lc 9:23).

Essa cruz não é apenas um símbolo de sofrimento, mas de morte voluntária para a própria vontade, a fim de viver integralmente para Deus (Gl 2:20).

Entretanto, o mesmo Senhor que chama também promete recompensar:

“Bem está, servo bom e fiel… entra no gozo do teu senhor” (Mt 25:23).

A palavra grega para “gozo” é χαρά (chara), que descreve uma alegria completa e eterna, distinta de qualquer prazer passageiro.

A recompensa não é apenas receber algo de Deus, mas entrar na Sua própria alegria — um privilégio reservado àqueles que perseveram até o fim (Ap 2:10).

Conclusão

Ser igreja é infinitamente mais do que se reunir em um endereço fixo; é viver como ἐκκλησία (ekklēsía) — a assembleia dos “chamados para fora” (ek = para fora; kaleō = chamar) — convocada pelo próprio Deus para transformar o mundo (Mt 5:13-16).

A Palavra nos mostra que quando a igreja permanece centrada apenas em si mesma, corre o risco de repetir o erro da comunidade de Jerusalém antes da perseguição (At 8:1), limitando o alcance do evangelho e negligenciando o mandato de Cristo.

Por outro lado, quando obedecemos, vemos o poder do Espírito Santo se manifestar, como no Pentecostes (At 2:1-4), e o Evangelho avançar de forma irresistível, alcançando vidas, famílias e nações (At 1:8; Rm 10:14-15).

A missão não é privilégio de poucos; é o encargo sagrado de todos os que pertencem ao Corpo de Cristo (Ef 4:11-12; 1Pe 2:9).

Hoje, Deus nos chama novamente para levantar, sair e ser luz onde há trevas (’or, אוֹר, no hebraico de Is 60:1).

Assim como Abraão foi chamado a deixar sua terra (lek-lekha, Gn 12:1), como Moisés foi enviado ao Egito (shalach, Êx 3:10) e como Paulo foi comissionado aos gentios (apostellō, At 9:15), nós também somos enviados. Somos chamados para fora — e a hora de ir é agora.

  • Você tem vivido como parte ativa da missão de Deus ou como espectador passivo?
  • Sua vida cristã tem sido voltada para fora, buscando os perdidos, ou apenas para dentro, servindo ao que já é familiar?
  • Você tem sido sal e luz no seu ambiente de trabalho, família e comunidade (Mt 5:13-16)?
  • Está disposto(a) a ajustar sua agenda, seus recursos e seu coração para obedecer ao ide (poreuthentes, Mt 28:19) de Jesus?

Oro para que este Refrigério Teológico tenha edificado profundamente sua vida, trazendo clareza, temor e graça ao tratar de um tema tão urgente como o chamado missionário da igreja.

Se esta mensagem falou ao seu coração, deixe seu comentário e compartilhe com outros — alguém próximo pode estar precisando exatamente desta direção.

Você já se perguntou como entender a Bíblia com mais profundidade e aplicar seus ensinamentos com fidelidade?

Muitos cristãos enfrentam dificuldades ao ler e interpretar as Escrituras, especialmente em temas desafiadores como este.

Eu também já enfrentei essas barreiras, e posso afirmar: é possível crescer no conhecimento bíblico com equilíbrio, verdade e graça!

E você? Como tem sido sua jornada com a Palavra de Deus?
Tem separado tempo para buscar, cumprir e ensinar (Esdras 7:10) os princípios do Reino?
Tem dúvidas que ainda precisam ser esclarecidas?
Sente que precisa de um direcionamento seguro e bíblico para tomar decisões?

Não caminhe sozinho(a)!
Junte-se a milhares de alunos e alunas da Comunidade Teologia24horas — uma comunidade global de estudantes, professores, líderes e apaixonados pela Palavra, espalhados pelo Brasil e por várias nações.

Aqui você encontra:

  • ✅ Ensino bíblico claro, fundamentado e acessível
  • ✅ Acompanhamento pastoral e teológico
  • ✅ Cursos 100% online com certificação
  • ✅ Plataforma completa para estudar onde quiser, no seu tempo e ritmo

📲 Clique aqui para baixar gratuitamente nosso aplicativo e comece hoje mesmo sua jornada de crescimento espiritual.

Vamos juntos mergulhar nas profundezas da Palavra, restaurar os fundamentos e viver a verdade com ousadia e santidade.

#RefrigérioTeológico #Eclesialogia #ChamadosParaFora #Ekklēsía #GrandeComissão #Missões #Missiologia #FranciscoMiranda #Teologia24horas

Instale o Aplicativo Teologia24horas agora! Baixe gratuitamente o nosso app no seu smartphone, disponível para iOS e Android. É simples e fácil: abra a loja de aplicativos no seu celular, pesquise por Teologia24horas, instale o app, faça sua inscrição e torne-se membro da nossa comunidade teológica. Descubra funcionalidades incríveis e vantagens exclusivas, tudo isso na palma da sua mão. Comece agora mesmo a transformar sua experiência teológica!

Artigos relacionados

Faça o seu comentário...