PaRDeS, os níveis da exegese judaica!

Às vezes, depois de ler um texto e tê-lo entendido não fica a impressão que mais coisa foi dita? Essa intuição foi por tempos bem-vinda e ainda continua a ser padrão no judaísmo rabínico no modo de interpretação PaRDeS.

Olá, graça e paz, aqui é o seu irmão em Cristo, Pr. Francisco Miranda do Teologia24horas, que essa “paz que excede todo entendimento, que é Cristo Jesus, seja o árbitro em nosso coração, nesse dia que se chama hoje…” (Fl 4:7; Cl 3:15).

método que os judeus usam para interpretar a bíblia é o PaRDeS, alguns chamam os quatro níveis do conhecimento. Nesse Refrigério Teológico veremos tudo que você precisa saber para utilizar o método pardes em sua interpretação.

O Método PaRDeS

Método פַּרְדֵּס PaRDeS “pomar” é o processo interpretativo desenvolvido pelo judaísmo rabínico para leitura dos textos sagrados. Foi empregado primordialmente para a exegese da Torá, mas estendido a outros escritos bíblicos e talmúdicos.

Talmude* (em hebraico: תַּלְמוּד, transl. ṯaləmūḏ cujo significado é estudo) é uma coletânea de livros sagrados dos judeus, um registro das discussões rabínicas que pertencem à lei, ética, costumes e história do judaísmo. É um texto central para o judaísmo rabínico que usa largamente o pardes.

O Mishná foi redigida pelos mestres tanaítas (Tannaim), termo que deriva da palavra hebraica que significa “ensinar” ou “transmitir uma tradição”.

Os tanaítas viveram entre o século I e o século III d.C. A primeira codificação é atribuída ao Aquiba (50 d.C. – 130 d.C.), e uma segunda, ao Rabi Meir (entre 130 d.C. e 160 d.C.), ambas as versões tendo sido escritas no atual idioma aramaico, ainda em uso no interior da Síria.

A palavra hebraico פרדס PaRDeS é um acróstico das palavras abaixo.

  • A letra פ (PEI) –  פשט P’shat (literal, superficial) | a denotação mais simples, óbvia e literal. Apesar de literal, leva em consideração as figuras de linguagem e pensamento facilmente reconhecíveis pelo leitor. Há preocupações filológicas, como a etimologia e gramática.
  • A letra ר (RESH) – רמז Rêmez (alusão, alegoria) | interpretações tipológicas ou alegóricas enfocando desde uma só letra, palavra ou perícope (trecho).
  • A letra ד (Dalet) – דרש Drash (associação/investigação) | inferências comparativa entre os textos de acordo com os middot, ou regras hermenêuticas, tais como as Sete regras de Hillel, as Treze regras do rabino Ismael ben Elias e as 32 regras do rabino Eliezer ben José ha-Galili.
  • A letra ס (Samech)סוד Sôd (segredo/oculta) | a interpretação mística que pressupõe um significado profundo e espiritual.

Das letras iniciais desses princípios surgiu o acrônimo PaRDeS, que coincide com o termo persa e hebraico paraíso, esse termo aparece no conto/lenda dos quatro rabinos que adentraram no jardim. O primeiro, que procurou na Torah o sentido literal (Pshat), morreu. O segundo, que procurava o sentido alegórico (Ramez), enlouqueceu. O terceiro, que nela buscava o sentido doutrinário (Derush) virou um traidor apóstata e somente o quarto rabino, que buscou o sentido secreto (Sod) entrou e saiu em paz, tornando-se um iluminado.

No processo hermenêutico do PaRDeS um texto pode ser interpretado com uma só abordagem ou todas combinadas, conciliando seus significados e aplicações. Contudo, raramente ocorre no mesmo comentário uma análise sistemática de um texto com as quatro abordagens.

Desenvolvimento do Método PaRDeS

Agora sabemos que a palavra PaRDeS nada mais é do que um conjunto de QUATRO palavras – sendo cada palavra responsável por um método de interpretação. Bom, agora que sabemos o que é o método PaRDeS, a seguir estudaremos cada um desses métodos de interpretação, fique de olho nos próximos tópicos.

1 – Método פשט P’SHAT (literal, superficial)

P’shat פשט (literal, superficial) – Esse é o mais comum e mais utilizado pelos pregadores e pastores – e um método de interpretação MUITO SIMPLES, onde você lê o texto e interpreta exatamente o que se lê.

Por exemplo: O senhor é meu pastor e de nada terei falta (Sl 23:1). Algumas pessoas interpretam exatamente como o texto diz “Deus é meu pastor e não vai me deixar faltar nada” – É uma interpretação exata do texto.

Dentro desse modelo de interpretação, você não usa outros textos para explicar a passagem e também não faz uso de figura de linguagem. A maioria das pessoas ficam exatamente neste nível de interpretação. A seguir avançaremos mais nos modos de interpretação.

2 – Método  רמז RÊMEZ (alusão, alegoria)

Rêmez רמז (alusão, alegórica) – Esse método de interpretação já é um pouco mais avançado, dentro desse método de interpretação, usamos “alusão, alegorias, figuras de linguagem”.

O foco neste tipo de interpretação não é levar o texto ao pé da letra, por exemplo, Sl 23:1 como já mencionamos – “O Senhor é meu Pastor e de nada terei falta”.

Usando o método de interpretação rêmez, podemos interpretar assim: Meu pastor seria uma FIGURA de linguagem, assim como o pastor protege suas ovelhas, assim o Senhor nos protege.

Reparou que dentro desse método de interpretação já procuramos entender melhor “o que quer dizer” cada palavra? – Sempre neste segundo método devemos observar as figuras de linguagem e tentar entender realmente o que quer dizer o texto – sair literalmente do LITERAL.

3 – Método דרש DRASH (associação/investigação)

Drash דרש (associação) – Esse método de interpretação é um dos mais usados, não é todos que conseguem utilizar, aqui a interpretação é por associação, isto é – um texto explica o outro.

Aqui é acostumado usar até dois textos para explicar um terceiro. Jesus usava muito esse método de interpretação, ele sempre falava de outro texto para explicar um texto – ou até mesmo explicar os ensinamentos dele.

Por exemplo, Ele usou os textos bíblicos para combater a Satanás em Mt 4.

Esse é o terceiro nível de interpretação, aqui você utiliza textos bíblicos e figuras de linguagens para justificar e interpretar um texto. Mesmo exemplo dos anteriores – “O Senhor é meu pastor” – Agora aqui – você irá entender que é uma figura de linguagem e vai usar outros textos bíblicos para EXPLICAR porque Davi falou isso.

Você entendeu a pegada deste método de interpretação? – Textos associativos e figuras de linguagens, fechou?

4 – Método סוד SÔD (segredo/oculta)

SÔD סוד (segredos) – Esse é o método de interpretação mais difícil, os graus de dificuldade só vão aumentando. Esse é o último nível de interpretação, aqui são estudados os mistérios bíblicos.

Aqui precisa de um grande domínio de figura de linguagem, textos associativos e o principal – um conhecimento sólido do contexto (judaico) do acontecimento bíblico.

Sabe aqueles textos difíceis que não é muito bem explicado? Então – esse método visa entendê-los.

método SÔD tenta descobrir a mensagem por trás do versículo ou do acontecimento. Um exemplo – “JESUS CHOROU” – Dentro de uma interpretação usando método SÔD, a gente conseguiria extrair – no sentido literal, uma associação e agora usando o método, procurar entender o motivo (cultural) entender o real significado desse choro.

Alguns exemplos

Bom, agora que já conhecemos os quatros métodos de interpretação judaica, vamos analisar um texto bíblico com calma tentando utilizar algumas das técnicas de interpretação, o primeiro texto que iremos interpretar é esse, observe:

No final desse período, Jesus levantou a voz com um grito de profundo significado: “Eli, Eli, lamá sabactâni? O que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mateus 27:46; veja Marcos 15:34).

P’shat – Deus simplesmente abandonou Jesus;Rêmez – Opa, eu acho que “desamparaste” é figura de linguagem, vamos mais fundo;Drash – Vamos analisar se e figura de linguagem e fazer uma associação com outros textos;Sôd – Iremos analisar as figuras de linguagens, verificar os textos associativos e fazer uma interpretação da cultura na época e tentar entender o que quer dizer o texto.

Bom, vamos interpretar agora esse texto, nos tempos de Jesus era muito comum – o rabino fazer a leitura bíblica e repetir muitas vezes – isso era para que todos guardassem “a parasha” da semana.

O rabino apenas falava as “primeiras palavras” da parasha (porção da semana da leitura) e todos sabiam exatamente o que viria a seguir, por exemplo: O Senhor é meu……e de nada terei falta – Era exatamente assim que eles estudavam antigamente nas sinagogas.

Quando Jesus disse “Deus Meu, porque me desamparaste” – Ali na verdade Jesus estava fazendo uma menção ao SALMOS 22 – Todos que estavam ali entenderam o último ensinamento de Jesus – que foi exatamente o Salmos 22, observe o texto a seguir:

Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Por que te alongas do meu auxílio e das palavras do meu bramido?….Porque não desprezou nem abominou a aflição do aflito, nem escondeu dele o seu rosto; antes, quando ele clamou, o ouviu.

Ficou claro neste texto que Jesus estava apenas passando seus últimos ensinamentos para aqueles que seguiam a Ele. O versículo trata exatamente disso, Salmos 22.

Como o Salmos 22 é um salmo messiânico, Jesus momentos antes de se entregar a morte – ele se declara o Messias – se você ler o texto inteiro de Salmos 22 – você entenderá perfeitamente porque Jesus disse aquelas palavras. Você conseguiu perceber que usamos os quatros métodos de interpretação bíblica?

Agora para finalizar, vamos analisar mais um texto e fazer uma interpretação, o texto é de João capítulo 9, leia o texto por favor, vou jogar alguns versículos aqui:

Tendo dito isto, cuspiu na terra, e com a saliva fez lodo, e untou com o lodo os olhos do cego. E disse-lhe: Vai, lava-te no tanque de Siloé (que significa o Enviado).

Foi, pois, e lavou-se, e voltou vendo. Ele respondeu, e disse: O homem, chamado Jesus, fez lodo, e untou-me os olhos, e disse-me: Vai ao tanque de Siloé, e lava-te. Então fui, e lavei-me, e vi. Levaram, pois, aos fariseus o que dantes era cego. E era sábado quando Jesus fez o lodo e lhe abriu os olhos.

Esses são alguns versículos do texto de João capítulo 9, neste período desta passagem, os fariseus já tinham definido que era PROIBIDO fazer qualquer remédio aos sábados, para você ter noção – as pessoas morriam nessa época, se caso fosse no sábado.

Era estritamente proibido fazer remédios no sábado, segundo o farisaísmo. Já dentro das leis oral – (talmud, midrash, etc) – Os rabinos diziam que se fosse para PRESERVAÇÃO DA VIDA – Eles podiam fazer remédios (se for para curar alguém).

Esse ato de Jesus de cuspir no chão, trata-se exatamente uma MENÇÃO a remédio, Jesus estava fazendo como se fosse um remédio, isto é – seria lícito curar o cego. Ele usou da cultura da época “de poder salvar apenas com remédio”, então ele cuspiu no chão – uma forma de fazer remédio e curou o homem.

Isso é uma interpretação rabínica sobre o texto bíblico – utilizamos exatamente o método judaico para interpretar. Espero que esse estudo tenha ficado claro – e use bastante essa forma de interpretação.

Vimos que o método de interpretação judaica é muito mais eficiente do que qualquer outro – pois visa interpretar a bíblia realmente como ela é. Quando o pregador tem domínio dessa metodologia ele consegue extrair as melhores interpretação dos textos bíblicos.

Conclusão

Com a diáspora e a interrupção das atividades sacerdotais, muitas normas da Torá não eram mais aplicáveis enquanto os judeus mais piedosos enfrentavam dilemas para continuar a praticar a religião entre povos estranhos. Nesse contexto, na época dos amoraítas (séculos III a VI d.C.) a abordagem derash foi mais útil. Há implicitamente uma busca por intenção autoral, no caso a autoria seria divina, nos textos sacros.

A exegese expansivel da derash providencia respostas para questões de moral religiosa ou social não explícitas nos textos autoritativos. Seria a interpretação “filosófica”, em uma época quando filosofia significava dialética, mas a derash não se limitava a uma inferência de lógica pura. Antes, constitui o método da midrash.

A midrash, uma ampliação do significado e sua aplicação normativa, emprega intensamente paráfrases, analogia e narrativas ilustrativas.

O uso dialético da peshat e da derash foi onipresente em toda a Idade Média do Mediterrâneo. Dada sua associação com a midrash, o raciocínio da derash contribuia para a homilética, as exposições comunitárias, considerando sua aceitação retórica pela audiência. As quatro abordagens passaram a ser reconhecidas com o acrônimo PaRDeS na Espanha no século XIII.

No início do segundo milênio as abordagens remez e sod contribuíram para a emergência da cabala. Por sua vez, os cabalistas preferiram essas abordagem, empregando as técnicas de buscar sentidos em acrônimos (notariqon) ou ler as letras com seus equivalentes numéricos (gematria). Com base nelas, em alguns círculos mais secretivos havia uma atitude esotérica. Essa atitude pressupunha que o leitor deveria ter um preparo espiritual para poder compreender os sentidos mais profundos, como na história do Rabi Aquiba. E como a leitura influencia a composição, vários textos da Idade Média tardia, mesmo com função referencial, como tratados de astronomia (astrologia), farmacologia e alquimia, passaram a ser escritos de forma crípticas.

Em contraposição aos místicos, uma tradição crítica na esteira de Maimônides favorecia a peshat. Na Europa, a peshat era largamente empregada por Rashi e por Abraão ben Esdras. Mais tarde essa leitura acarretaria no renovado interesse pelo sensus litteralis entre exegetas cristãos e hebraístas do Renascimento, como Nicolas de Lyra e Johann Reuchlin, influenciando a hermenêutica dos reformadores.

Com o iluminismo judaico (haskalá), métodos histórico-críticos passaram a ser combinados com o PaRDeS, principalmente entre intérpretes reformados, liberais, masorti e ortodoxos modernos. Mesmo entre judeus não religiosos ou sem envolvimento com círculos rabínicos, como Freud ou Franz Rosenzweig, há resquícios do PaRDeS.

O misterioso Messieur Chouchani (1895 –1968) utilizava o PaRDeS no ensino de seus discípulos Emmanuel Levinas e Elie Wiesel. Levinas particularmente desenvolveu seu método de leitura e uma análise fenomenológica extremamente similar ao pardes.

A Idade Média foi a era das interpretações quádruplas. Entre exegetas cristãos na Europa predominava a quadriga, a combinação de abordagens literal, alegórica, moral e anagógica (escatológica). No islam há práticas interpretativas similares, especialmente entre as escolas jurisprudenciais xiitas jafari e mustali, mas não como um método sistematizado.

Desde o humanismo renascentista, a Reforma e o Iluminismo, essa abordagem de múltipla leitura passou a ser preterida. Leituras múltiplas de um mesmo texto ficaram relegadas ao esoterismo marginal enquanto emergiu um consenso de que os sentidos alegóricos extrapolavam o texto.

Um raro paralelo de interpretação quádrupla ocorreu no Direito, com F.C. von Savigny (1779 –1861). Savigny propunha uma interpretação gramatical, lógica ou sistemática, histórica e teleológica das normas jurídicas, para posteriormente escolher quais seriam aplicadas em uma argumentação jurídica.

Saiba mais

Recentemente, Mordechai Z. Cohen (2003, 2011, 2016) tem publicado extensivamente estudos sobre a hermenêutica judaica, incluindo sobre o PaRDeS. Van der Heide (1983) oferece uma boa introdução aos estudos do pardes, assim como Fishbane (2012).

Esse foi um estudo do método PaRDeS – que é um método totalmente prático que visa como interpretar a bíblia de forma totalmente diferenciada. Se você gostaria então de aprimorar seus conhecimentos bíblicos – é fortemente recomendado que você estude esse método.

 

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